quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Friends, bloggers, countrymen...

Parece que já não bastavam os balanços de fim-de-ano, em que toda a gente emproa na sua opinião como obelisco para prática onanista, atribuindo-se reputação pessoal para regurgitar listas de preferências sem uma nota que substancie em que se sustenta a validade (subjectiva e comunicacional) dessas preferências; agora anda praí uma votação ad hoc para "eleger" a melhor blogagem da praça.
Para cortar cerce a raiz do rumor que se iria espalhar célere a refogar a inquietação da nação, responsavelmente trato já de dissipar as dúvidas: não participarei no escrutínio. Creiam-me, não se trata de má-vontade, ressabiamento de mesquinho misantropo (I despise the little people - call me cretan), ou qualquer concepção autofágica da irreprimível tendência entrópica da blogosfera para a hierarquização e fechamento institucional (digamos assim) e editorial das possibilidades expressivas que lhe assistem. São mesmo dificuldades operativas.
Vejamos: primeiro, elogio em boca própria é vitupério, e tratando-se de uma votação, com os princípios lógicos que lhe assistem, só um candidato (como cada votante se torna) esquizofrénico, simultaneamente fajuto e cândido, poderia participar numa votação reconhecendo-se indigno da sua eleição e não votando em si mesmo, pelo que o facto de não se votar em si mesmo é necessariamente reflexo da natureza perversa de semelhante arremedo de plebiscito: lembrete de que há coisas que não são referendáveis. Daí, na face da minha imaculada honestidade (o meu pénis mede 26 cm), só poderia participar numa votação onde votasse em mim próprio em primeiro lugar, e com voto secreto... senão seria elogio em boca própria e seria vitupério. Na verdade, quem sucede infalivelmente em blowing is own horn é o autor da ideia, o que faz estruturalmente dos votantes algo de uns beneméritos involuntários, para lá de uma algo dissoluta ciranda de eleitorais passares da mão pelo pêlo, a risco de enrodilhar-se uma bola na garganta (hummm).
Em segundo lugar, as afinidades blogosféricas fazem-se por diversas razões, ideológicas, estéticas, ontológicas, epistémicas, bla bla bla, mas que acabam criando espectros de sociabilidade donde resultam redes que cumprem uma obrigação moral de reciprocidade, pelo que a sinceridade no voto implica uma perversa cuspidela naquilo que sustenta a teia blogosférica, o prato onde se come, o que é uma grande falta de educação e de higiene; e a insinceridade implicaria uma perversão dos supostos ditames valorativos (obviamente subjectivos e para além disso, neste formato, incomunicados, logo, criando uma mixórdia plebiscitária inescrutável nas motivações definitórias do que é o "melhor"... e ainda se queixam da pergunta do aborto...) que estarão na base na "eleição" dos "melhores" coisos e tal.
Em terceiro lugar, não posso voltar aos electrochoques antes de período de nojo de dois meses para os neurónios não se habituarem mal ao curte do body electric (o Whitman era um fofo, mas sabia lá...), o que indubitavelmente sucederia com o apelo irrestível à manifestação das minhas múltiplas personalidades para conciliar a atabalhoada hierarquia do reino (melhor blog; melhor blogger; melhor blog feminino; melhor blog masculino; melhor blog temático...: que saudades dos Óscares).
Em quarto lugar, isto faz-me lembrar perigosamente coisas como votações para "o melhor português", a animar a energúmena espinha da pátria que precisaria pelo menos de ter umas lições de estatística na escolaridade obrigatória para ter juízo. Não que a comparação pretenda sugerir que o futuro vitorioso esteja necessariamente próximo de ter uma vozinha de cana rachada e um fascínio saloio pelo que velam as saias de governantas.
Finalmente, o mais importante dealbreaker, e relembrando o imperativo de votar no próprio: para fazer o pleno e pretender ser também o melhor blogger feminino, necessariamente desvelar-se-ia que envergar vestidos (condição de elegibilidade para semelhante podium, presumo) me faz as ancas gordas. E pra isso, acima de tudo, a menos que o júri aceite como prova as minhas empertigadas man boobs, é que eu não estou...

10 comentários:

Anónimo disse...

Ora, sim senhor. Pois gostei. E, de repente lembrei-me, da entrevista de hoje ao Tiago Barbosa Ribeiro no Miniscente. Aquele jovem deixou-me preocupada. Eu tenho que falar baixinho, não vá a malta deixar de votar em mim, ou, pior, não vá a tal Comunidade Blogosférica dar pela minha existência, perceber que eu não me afirmo nos debates e polémicas e frustrar-me o sonho de lhe pertencer. Ainda me retiram a meia dúzia de leitores, que tantos telefonemas, bolinhos de canela e ameaças me custaram. Eu até tenho andado a tentar descobrir como é que me hei-de safar nos ritos de iniciação à Comunidade e, mais, decorei umas quantas palavras blogáveis, tipo misógino, antropófago e onírico. E, agora, tu até usaste misantropo, autofágico e onanismo. Tu és bom, sempre te disse, não fossem estes devaneios de andares para aqui a cortar correntes e a dar nas orelhas da Comunidade ainda tinhas hipótese no site meter e, às tantas, uns quantos votos, quem sabe até no melhor das gajas, mas, não!, pões-te aqui nestas merdas, armado em outsider com piadinha. Não sabes usar caixas de comentários como eu? Já agora, não fazes mesmo parte da comunidade, pois não? Quantos leitores tem o barraco? Querem ver que me tramo!! Hummm....Pois, eu nem queria dizer estas coisas, mas sais-me com este post e, olha, deu-me para a fraqueza.

Anónimo disse...

Oh pá, desde que nunca votes em mim pra coisa nenhuma podes dizer o que quiseres (quem é que te "trama"?).
Os 12 de sempre, como "deve de ser".
É no que dá levar demasiado a sério a proposição "eu não sou deste mundo".
Em compensação, essas visões enclausurantes da blogosfera (que fazem sentido analiticamente, mas são mais discutíveis propositivamente) sempre têm o benefício de nos providenciar uma nova fase de engate (que faz sempre falta): "queres pertencer à minha blogosfera"?

Anónimo disse...

Ok, este blogue aceita que há várias blogosferas, até concordo com a coisa do analítico e propositivo (não pode ser tb pretensioso?) e lamento, mas voto em ti para a melhor frase engate. Hum, está tudo bem, então.

eduardo b. disse...

Esta posta é verdadeiramente obscena. Ainda cheguei escrever aqui umas linhas acerca do assunto, mas depois caí em mim (não parti nada) e pareceu-me que seria de um mau gosto até em mim inusitado esmiuçar as razões desta minha opinião. Tu conhece-las, anyway. Parabéns.

Anónimo disse...

Tulipe (desculpe por tratá-la por "tu"...), não sei se há várias blogosferas, depende de facto da questão de nos situarmos analiticamente ou propositivamente. É certo que analiticamente se criam círculos de afinidades várias (algumas com tradução ou origem, aliás, extra-blogosférica), mas não é certo que sejam estanques, e propositivamente tendo a achar mais interesantes os registos de escrita que trespassam o fechamento que as expectativas editoriais que asseguram a continuidade desses círcuos implicam. Onde assentamos no perigo será pois no registo propositivo de um reducionismo elitista da blogosfera, I presume (logo, suponho que sim, propositivamente pretencioso, para quem o defenda presumindo-se pertencente ao círculo eleito). Melhor frase de engate, acho que basta tropeçar em qualquer sítio para encontrar uma melhor, mas... nunca será dito de mim desdenhar um elogio em boca alheia, por mais que discordante (em boca própria). Acho que pelo menos deveria ter um trejeito mais carnal, que para engate virtual é preciso compensar os bits. Qualquer coisa como, sei lá, "dá pra mim sua blogosfera", "junte sua blogosfera com a minha" ou o clássico-à-espera-de-reconhecimento "me posta, vai".

Julinho disse...

Eduardo, como bem sabes, presumir que eu sei qualquer coisa costuma sair sempre furado. Para o caso, o furo fica pra mim, sequioso da escrita que a caixa de comentários (puta) não registou negando-te o domínio tecnológico. Mas não posso deixar de admirar a contenção de não explorar sendas de pernas abertas como as sinalizadas por man boobs e outros obscenos (sentido obrigado...) placards - eu não seria homem (mulher?...) pra tanto. Nada se perde, nada se ganha?... (credo, agora é que me dou conta, que transposição expressiva tão coninhas)

eduardo b. disse...

Got it...

Anónimo disse...

Got what?... (get it? - I really never don't)

eduardo b. disse...

That... over there... See?

Anónimo disse...

Primeiro que tudo, relembrando que sou mesmo (mesmo) lerdo, para a próxima coloca a correcção entre aspas, que primeiro pensei que o "pretensioso" tinha a ver com o assunto em discussão, não com um erro ortográfico.
Dito isso, gracias pela correcção, que não é preciso justificar psicologicamente: principalmente quando corringindo erros incorporados, é uma obsessão produtiva. Por isso mesmo, acho que é escusado reforçar simbolicamente o carácter obsessivo, uh, da obsessão com s's de acrescento... (wink)
Bom, agora piada à parte, não duvido que essa votação possa ser pessoalmente proveitosa em muitos aspectos, como precisamente no descobrir de outros blogues que pessoas que valorizemos tenham na sua estima ou admiração. O que me parece é que, dados os pressupostos de base em que a ideia de votar em melhores blog-qualquer-coisa assenta (em geral, e nesta configuração particular), e que muito genericamente acarretam a ideia de hierarquização e fechamento social de um espaço que me parece essencialmente interessante pela diversidade e originalidade expressiva que pode facilitar (o que se debate com arregimentações de qualquer natureza), o caso desta votação é um em que as suas eventuais virtudes privadas (como as que apontas, mas que apesar de tudo não dependem deste mecanismo específico de referenciação) estão a meças com os seus vícios públicos (lógicos e simbólicos): são obviamente estes que me contrariam.
Já o onanismo não era tanto aplicado a este domínio de manifestação de preferência, porque não é (pelo menos ainda, acho, apesar destas votações) um campo onde haja um domínio de autoridade cultural no exercício do gosto e/ou principalmente da afinidade. É certo, contudo, que isso não me levou a procurar a metáfora sexual adequada para o domínio em discussão. E quando constato que sexo em grupo é, de facto, a metáfora desejável para essas dinâmicas, e começo a tergiversar na defesa da minha oposição às mesmas, devo dizer, com meridiana indignação: isso é um golpe baixo (uof)
(onde é que se vota mesmo?...)