sábado, 18 de novembro de 2006

Gone to Earth 2
Vim, há umas semanas, algo (muito) sentido de uma re-apresentação do espectáculo «Maio, Maduro Maio», onde, sob a batuta sage do José Mário Branco (desde logo na inteligente, justa e nada programática escolha das canções), o próprio, a Amélia Muge e João Afonso (acompanhados do António José Martins, e peço desculpa mas não reconheci o percussionista) recriam (de facto) e animam (de anima) canções do Zeca Afonso. Entre a entrega e os sabidos dons assinaláveis (enfim, o João Afonso... até safou a «Utopia»...) que tornam a coisa uma celebração profundamente viva, avessa ao funéreo e/ou saudosista, e o José Mário Branco entregue ao papel de avô esquerdista rezingão (desta feita com pérolas deliciosas como, «como é que estamos de afinação?... esse conceito pequeno-burguês...»), o próprio evocou «Benditos» como uma das mais belas canções do Zeca, testemunhando ter-lhe este confidenciado ter sido composta aquando da notícia do falecimento do Adriano Correia de Oliveira. Digo-vos isto tudo, que é dever propagar, mas também porque tendo essa canção a particularidade de não ter sido gravada com a voz do Zeca, constando do seu último disco «Galinhas do Mato», quando aquelas benditas cordas vocais já não podiam mais espalhar a sua graça, tudo isso lembrou-me a derradeira canção, desse derradeiro disco, encarnada pelo Janita Salomé e o inacreditável de imponência telúrica coro Cramol (já não se fazem assim) (locomovida a benditos adufes, e aqueles trompetes de anunciação, que é coisa da impressão digital do José Mário Branco). Além de ser das coisas de beleza incompreensível, brotada de fonte secreta apenas uma vez visitada por um só homem, impõe-se-me como a única ocasião que conheço em que um corpo regressado à terra a fez cantar. Assim:

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