quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Identificazione di un stronzo

Com uma temeridade quase a trespassar a fronteira do reckless, não fôra a magnânimidade cristã de reaching out aos self-inflicted hobos do pedaço (quer dizer, não estou a fazer juízos sobre as outras criaturas do saco, mas tão só a cobardemente não me deixar só na minha auréola de duvidosa (vide...) auto-exclusão, dessa forma pretendendo desencarcerá-la de acusações de auto-sagração moral martirológica ao mesmo tempo que torno a sua matéria de arguição mais factível (nailed it?)), a Sara, gentil como sempre precisamente para com quem sistematicamente faz por o não merecer, agrega a minha irrepresentável pessoa (daí o bezerro, como todos os exegetas bíblicos que me entopem a caixa de correio já perceberam) ao mais recente desafio de figuratividade blogosférica, tão caloroso como frustrante. É sem dúvida acolhedor que se queira sempre ir um passo adiante na corporificação das vozes soltas que se enrodilham nos humores quotidianos da nossa carne por via destes estranhos signos que vamos endereçando em vago compromisso aos viandantes de muitos algos por vias destes estranhos algures. Eu, claro, sempre resisti a essa virtuosa tentação, cônscio na minha própria carne e consciência que o arremedo de pessoa que se pode agregar da inferência subjectivante deste discurso localizado não só está perfeitamente distante como literalmente às turras com aquele apenso às mãos que digitalizam isto neste momento (lá foi mais um tabefe - I hate my guy). Presumir um corpo por trás de uma escrita com a qual, numa medida ou noutra, já nos aninhámos, é sempre a convocação de uma violenta dissonância cognitiva que só (concebo) deve poder ser bem resolvida por um cândido wishful thinking (para o bem e para o mal: estou certo que imensa gente deve suspirar shallowmente de alívio por o Pereira Coutinho parecer um infante acabado de desmamar e já a querer (ou a querer afirmá-lo, isso sim mais problemático) com os seus deditos gorduchos enfiar Dunhills nos beiços - dissonância estética não menos fatídica que a outra) de congruência fenomenológica, ou imensa capacidade de adaptação à vil balbúrdia empirista que destrambelha os corpos, passos e palavras que quereríamos unitariamente encorpados num espadaúdo palmo de cara com palavras caras nos bastidores à espera de trotar melifluamente da abertura somática correcta, para portanto, face ao desvelar da "dimensão oculta", gostar de nós mesmo assim (céus, so many issues).

Still, sendo reconhecidamente a pessoa aqui escrita tão dada, ao ponto de se perigar expondo a pessoa que a escreve, e sendo o verter corpóreo na morfologia Simpson um dispositivo tão genial de exposição mediada (ou check-out blogosférico) a permitir mesmo a uma manifestação de repulsa vir enlaçada num but it looks cute assim combinando de uma assentada o aviso cautelar de go no further com a caridade interactiva de não precisar de fazer uma u-turn espavorida, a minha pessoa escrita ordenou à que a escreve que sim senhor, tal encomenda de corpo (a alma lá se verá) não poderia ser mal-agradecida e vilmente desconsiderada. Portanto, lá enviei a única representação fotográfica da segunda pessoa (ainda que para efeitos não blogosféricos se considere a primeva, presunçosa) que possuía (pessoa (oh sim, se me possuo) e representação) aos senhores dos Simpsons. Ironicamente, fizeram os senhores questão de demonstrar que a congruência fenomenológica sometimes finds a way, principalmente quando lhe esticamos a implausibilidade do desafio, e recusaram terminantemente reconverter-me graficamente, com a desculpa esfarrapada de que não aceitavam full-nudes. Ora, primeiro, não tenho culpa que o meu auto-horror me tenha deixado como única, involuntária, captura fotográfica do meu fugidio self a imagem que no meu primeiro e último check-up o médico impulsivamente registou exclamando insensivelmente "tenho de documentar isto!". E depois disto, obviamente não serei cúmplice do autoritarismo estético que sistematicamente se crê autorizado à normativização de que corpos podem ou não ser sujeitos de exposição descomprometida.

Não obstante, fizeram esses senhores questão politicamente correcta de não transmitirem a mensagem que "pessoas como eu" (o que faz de mim a minha própria minoria - a seguir é a presidência, bitches) não teriam lugar no mundo Simpson, e como tal ofereceram-me a seguinte representação como modelo para qualquer futura apresentação no programa.
Como é evidente, com a minha resplandecente honestidade intelectual, queria retorquir-lhes que essa representação gráfica do anonimato estava, ainda mais ironicamente, já iconicamente tomada, certamente com outros candidatos presuntivos mais autorizados a eventualmente escudarem-se para os seus propósitos sob a sua derivação de celulose, e como tal incorporando uma notoriedade secretista de que a minha presunção não se sentia confortável em se ungir, facto de que misteriosamente pareciam os ditos cavalheiros antecipatoriamente conscientes, quando, sem qualquer emanação verbal da minha parte tendo-lhes tão somente enviado a famigerada foto sem mais comentário, ao enviarem-me a sua representação simpsoniana alternativa e sua justificação, terminam a exposição com um there you go, cocky prick (aliteração semântica batida que também estava para censurar, não se desse o caso curioso de também logo me parecer algo que eu seria perfeitamente capaz de escrever).

No fim de contas, ao expôr-me à vontade de uma identidade plena, dou-me conta de que a representação do anonimato já havia sido sequestrada, e de como a não-pessoa se tornou apenas outro caso particular de identificação. Como é cada vez mais evidente, a existência é um modo de captura expositiva, e a minha figuração, felizmente ao largo de qualquer caça lepidóptera antropomórfica, poderá quedar-se uma representação genérica de espécie hominídea desconhecida quem quer saber se errónea num volume borgesiano de História Natural Irrelevante. Algo com que, apesar de tudo, posso viver. Já que, como o Nicholson under Antonioni soube vislumbrar, a melhor coisa para sermos nós próprios, a seguir a nenhuma identidade, é uma identidade errónea. Portanto eis-me, e para me poupar à trágica ironia de, daqui a dez anos, errante, ao falhar yet another abordagem a um vagão no midwest, um outro inepto espalmado de boca na poeira se virar para mim e perguntar «you don't look familiar: didn't you write that yesterday man thing?», cá equivocamente me fico.

Diggin' old geezers

Os velhos porcos serão uma categoria nosológica de nostalgia sexual significativa na epidemiologia lúbrica contemporânea, certo. Mas convém, como para outras associações epidemiológicas grosseiras, não confundir a categoria social com as práticas problemáticas a que pode estatisticamente associar-se sem produzir uma reificação causal dessa correlação. O caso dos velhos porcos é particularmente interessante para contestar o fetichismo da correlação, na medida em que é ao partilhar da categoria etária sem ser absorvido pela encenação comportamental da denegação do seu declínio que se pode produzir um olhar mais lúcido sobre os mecanismos operativos do condicionalismo libidinoso. Foi pelo menos isso que, confessadamente, mais me interessou no último Lumet, e de que constantemente me relembrei ao tapar alguns buracos da minha oliveireana pessoal na cinemateca.
Como todo o Portugal tem uma opinião resolutamente autoritária sobre o Oliveira (e que melhor consagração de incontornabilidade cultural?, os parabéns que se fodam), não há-de ser grave que eu meta uma colherada muito direccionada para a presunção de que, tendo o nosso decano cinematográfico sido sempre graficamente (mas não inconsequentemente) maroto (a sério, não sei mesmo de que é que o pessoal se queixa, com sortidos mariolas e tudo (neste tudo condensando-se, para a minha carência de appetizers audiovisuais, a obra indubitavelmente mais espirituosa do cinema português aquém do César Monteiro, ainda que em alguns planos diferentes (piada ou não, é no Oliveira onde vejo assomar tremenda veia burlesca que a gente devida já lhe apontou)) para o entretém), tenho para mim que a exposição explícita (na exacta medida do rigorosíssimo pudor de quem sabe milimetricamente aquilo que quer mostrar) do corrimento dos veios lúbricos da vida só se começa a reverter em movimento interno para o registo da perversão supurativa dos desejos (mal-)contidos, na sua terceira idade de cineasta (sendo que, por alguns dos buracos mais recentes que cobri, na minha periodização subjectiva ele já irá na quarta, onde tais fantasmas internalizados provavelmente terão já passado mais para o banco de trás).
Foi a possibilidade situada desse olhar distanciado de quem esteve implicado no jogo e hoje lhe reconhece de fora a clausura que me surpreendeu no Lumet que, precisamente com os seus oitentas, está exactamente na fresca idade de explorar as possibilidades perceptivas de que tanto o Oliveira fez mister, e que tornam estes cineastas potenciais projectores das mecanicidades comportamentalistas que o cio acolhe como quem respira, e das perversidades perceptivas que engendram. Pareceu-me verdadeiramente emanar de um sítio de observador privilegiado (enfim, a respectiva pode não concordar comigo nisto) a plácida artesania corrosiva de jogar com a frustração perceptiva, a jusante e a montante, daquilo que julgamos ter visto e do que julgamos vir a ver (nomeadamente, mostrando uma lúbrica garina qualquer a levar trancada de quatro (e isto não sou eu a ser porco, é a descrição daquilo que representa e a que corajosamente se entrega) e só depois do acto consumado perceber que era a Marisa Tomei, que assim vimos e não vimos querendo retrospectivamente ver; e, ainda que menos ardiloso, mostrando o Seymour Hoffman a despir-se lentamente por uma casa, de recantos para si familiares, de um efebo requintadamente efeminado de andrajos ergonómicos para a intimidade, para se deitar na cama e acabar aí a levar a trancada por que pagara, nomeadamente, de narcóticos, por via endovenosa, que não outra), fazendo essa frustração reflectir sobre o espectador a consciência da perversidade formatada do seu olhar, e das suas expectativas adquiridas e naturalizadas, sobre que imagens lhe deviam ser dadas a ver, em que ordem, para que tipo de satisfação.
Quando os modos de produção cinematográfica mais desesperadamente se apegam à deception como mero procedimento de materializar artificiosamente uma cenoura por cima das poltronas dos multiplécses, alguém que exponha quanto a deception já está inclusa no pacote domesticado do papel de espectador, e por essa forma o devolva conscientemente (se necessário, envergonhadamente) a essa condição, merece não os parabéns indulgentes da mera morosidade diacrónica, mas os de a fazer cumprir plenamente em todas as suas estações. Ainda que por vias travessas, não conheço melhor elogio a fazer a um centenário.

Burning down the house

Triste que, nos dias em que por lá passei, a excepcional iniciativa da integral das obras para orgão de Messiaen, na Sé de Lisboa, tenha estado quase às moscas (e ao, não é certo, peregrino/hobo (no Fátima nestas paragens) que, uma vez, de passagem, arremessou com souplesse esquissando uma parábola oferendária dois objectos inidentificáveis, mas produzindo sugestivos ruídos aproximados daqueles embrulhos crepitantes de chocolate, para um vaso de flores no altar - e quão caloroso poderia ser que tal divindade adoptasse certos caprichos devotos mais associados aos seus confrades de panteão hindu e se tornasse sensível à satisfação piedosa de um seu sweet tooth?). Ainda assim, tal terá provavelmente contribuído para insuflar ainda mais o meu sentimento de colisão entre a transcendência alternadamente esotérica e tonitruante da música pulsada por aqueles tubos a assomarem-se a Jericó e o formalismo hierático com que se parecem ter recoberto estes espaços religiosos quase museificados, sufocados num apagamento tumular. Não admira que, porventura na excepção de um proselitismo chão a la padre Borga (também sempre o mesmo a apanhar, coitado), boa parte dos ministros da igreja católica (ou lá quem de direito) pareçam ter desbaratado o património musical e instrumental que são provavelmente a sua melhor herança (para os descomprometidos, claro está), o que torna esta associação da Sé à performance da piíssima, mas potencialmente desconfortável à mansa piedade ritualizada dos tempos, obra organística de Messiaen, talvez mais que louvável, corajosa (ainda que sem deixar de rentabilizar a ocasião para evangelizar um pouco de boleia, com comentários do cónego inclusos). É que não me parece mesmo que haja hoje, para lá deste repertório, melhor forma de ressentir, na configuração de indeterminação que seja (e mais fôra) a existência, o encantamento favorecido pelos passos em falso da inquirição cósmica, a promessa, o furor e o terror que instilariam a experiência religiosa do cristianismo primitivo (se me permitem). O Deus que toda a gente anda hoje a inferir na música de Bach seria, bem entendido, quase um Deus demonstrado como hipótese teórica matematicamente sustentada no fio rigoroso do movimento perpétuo na harmonia das esferas, um consolo metafísico racionalista. Mas o de Messiaen é mesmo o Deus sujo de moldar a lama, o dos mistérios incognoscíveis a meças paroxísticas com a carnalidade esfolada, o da revelação e da revolução, da interpelação e afronta. Deus que, sugere o meu desconforto com a convocação directa naquele espaço talhado em naftalina dos mistérios e revelações da fé pelas trompas de um orgão que é provavelmente o dispositivo de belicismo anímico (sua função primeira, pouco duvido) mais devastador que conheço, não será um que a igreja instalada na modernidade queira convocar para privar com apaniguados e curiosos. Não tenho assim tanto interesse e menos calejo no assunto para dizer que é pena ou alívio, mas o lamento revisionista momentâneo de não ter feito carreira de organista, como a forma eventualmente mais benigna de playing God à velha maneira disseminando temor e tremor nos novos tempos, insinua, com o arrepio de bem a candura poder emparelhar com a implacabilidade, o quanto há a dizer sobre fés que (ainda ou já) não têm pejo em trombetear, como esteja o Apocalipse ao virar da esquina, aquilo a que vêm.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Melhor contracapa até outras pessoas começarem a valorizar contracapas com algo mais que marketing genérico?

(mesmo que o raccord interfílmico não fosse dos meus exercícios críticos ou cinéfilos favoritos (o que o não desdignifica lá por as minhas razões para o favorecer poderem continuar a estar na sequência das que me fazem eleger preferencialmente livros com bonecos), a thoughtfulness que plantou este raccord triplo compósito 2-em-1 (que é um mimo, por muito que todos os would-be cinéfilos à minha imagem mas sem a minha cúpula de impunidade auto-depreciativa (amadores...) queiram protestar que seja "óbvio" - eu cá confesso inane que não me tinha lembrado da colagem com o Christine que faz tanto sentido que é quase pornográfico) na contracapa do catálogo do ciclo da Cinemateca dedicado ao Carpenter (ironicamente, com um título e uma capa não tão louváveis, mas novamente redimidas pela excelente valorização icónica das badanas - vide os meus guardiões de templo aqui ao lado, go on, make a move) só pode afiançar ilustradamente (para quem, como eu, precisa mesmo que façam o desenho) que este volume merece toda a confiança (e em particular a retribui ao exemplificar o Carpenter como barómetro por excelência, na amostragem da coabitação do consenso crítico contemporâneo do homem como autor com a dissensão ampla relativamente ao mérito dos filmes concretos afora os dois ou três pivotais, das possibilidades e limites da política de autores, como dimensão cinéfila analítica específica - possibilidades e limites que para a minha obtusidade sempre funcionaram principalmente como nominalização pedagógica de cautionary tales para presumir que se não gosto de algo presumivelmente gostável (pela crítica que não alcanço) a culpa deve ser provavelmente minha, posição de cinefilia pusilânime atracada algures entre a incompetência hermenêutica e uma correlata e sobrepujante política de afectos (e eu sei que é herético, ou letal se o homem ainda estivesse nas redondezas, passar da cinefilia aos wet dreams com o Ford, mas pecaminizar o insconsciente, para mais com palas e whisky ao barulho, é absolutismo moral insubscritível)), razão pela qual, provavelmente, cometi a imprudência inusitada de o papar num fim-de-semana, excesso que, por ter sucedido uma vez em mais de uma década, garanto não tornará a suceder: o vosso escárnio e correlata auto-confiança literatos continuam seguros comigo (que giro, tornei-me na miúda do liceu que mostrava as prebendas para que os miúdos gostassem dela, apesar de (precisamente por) não ter nada para emoldurar - oh poetic comeback, you're a spiteful cunt))

Greatest book cover ever?

(por entre as várias ironias que esta capa do The Work of Art in the Age of Mechanical Reproduction do Benjamin evidencia numa materialidade estética cristalina, não será a menor que se sinta a compulsão para singularizar o autor e sua criação, e o objecto que a viabiliza, por plasmarem como seu conteúdo e concretude estéticos a própria indiferenciação replicante inerente ao seu meio expressivo. É pela clarividência com que explicita e materializa esteticamente como sua matéria-prima e conceito a condição que é suposto dissolvê-la como todas as demais que esta capa entre capas absolutamente única não se repetirá: ela sucede em distinguir-se e resgatar uma espécie de meta-aura, qual facho derradeiro, precisamente ao encarnar simbolicamente ao limite a materialidade do processo reprodutor pelo qual a sua encarnação estética é dada à existência e que precisamente lhe nega o tipo de sagração ritual aurática, da obra única, de que Benjamin faz as exéquias; ao mesmo tempo que ilumina, pelo próprio irónico triunfo estético da auto-elegia da tese que condensa, como novas formas de unção das obras por nova aura, como seja pela acessibilidade condicionada (condição de possibilidade do fetichismo) do exemplar raro, se consagram hoje, via que este mesmo canto do cisne abre até à sua foz fenomenológica. Assim se constitui tão manifestamente ponto de charneira este vero manifesto de uma condição expressiva (de arte comodificada), a qual sublinha paroxisticamente ao singularizar-se nela incorporando-a como sua matéria-sujeito, que necessariamente a perfeita consubtancialidade que alcança na confluência trinitária de um meio expressivo, de um discurso sobre esse meio expressivo, e da sua formalização estética num só objecto, foi tomada e finalizada, irrepetível, momento que tem uma ressonância como que absolutizante para a diacronia da expressão estética humana (momentos que podemos retrospectivamente, genealogisticamente, tentar recuperar, o que é constitutivo do raisonnement crítico canónico, mas de que não é, et pour cause, tão evidente apercebermo-nos no seu momento de surgimento, o que provavelmente leva a que mais facilmente se manifeste contemporaneamente em empresa estética servil, de recursos limitados concentrados num formato que demande um gesto estético, ironicamente, mais depurado, imediato, e que, também ironicamente, mais facilmente se perca por essa imediatez na temporalidade resguardada pelos exegetas aturados dos greater schemes of expression), como algo que tão claramente encerre um item do catálogo das coisas que o ser humano pode exprimir (o que não quer dizer que o catálogo não seja sistematicamente reformulado ou ampliado com a transformação das mundividências e vivências humanas). Claro que amanhã poderão esclarecer que já tinha sido feito, e poderão vir a fazer sem saber que já havia sido feito. Mas acho que na tristemente evidente mirradíssima diacronia estética que carrego na cabeça, que para o efeito retórico não deixa de replicar a função das institucionais, nunca tinha percebido tão translucidamente como a marca d'água da perfeição é literalmente o esgotamento. Estava pasmado e algo assustado, para ser franco, até me aperceber que a marca d'água do discurso reificante esticado aos limites é perder todo o contacto com a expressividade própria (e indissociável) da coisa material, e portanto, umas linhas após, a minha posição talvez tenha passado dos ditirambos que vos, suponhamos, passaram pelos olhos, para uma mais modesta "yá, é gira", ou um pouco mais entusiasta mas ainda arrepelando o blasé "humm, clever" (e talvez devesse ter começado por aqui). De qualquer forma, como expus nesta minha ilustríssima galeria a coisa material e o pecado fica atenuado, acrescente-se quanto não deixa de ser ainda um indicador de monta da monta do objecto o quanto embandeirei em arco à conta da bodegueira de um invólucro de matéria tipográfica prensada, coisa que, sintomaticamente, já me havia retraído de comprar uma edição de uma obra, mas nunca incentivado a fazê-lo, para mais por si só, como obra de arte pois (reproduzida mecanicamente pois), sendo já proprietário do seu conteúdo, drapejado noutra toilette. Enfim, o seu a seu dono: David Pearson, o único nome de designer que espero vir a registar)