terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Greatest book cover ever?

(por entre as várias ironias que esta capa do The Work of Art in the Age of Mechanical Reproduction do Benjamin evidencia numa materialidade estética cristalina, não será a menor que se sinta a compulsão para singularizar o autor e sua criação, e o objecto que a viabiliza, por plasmarem como seu conteúdo e concretude estéticos a própria indiferenciação replicante inerente ao seu meio expressivo. É pela clarividência com que explicita e materializa esteticamente como sua matéria-prima e conceito a condição que é suposto dissolvê-la como todas as demais que esta capa entre capas absolutamente única não se repetirá: ela sucede em distinguir-se e resgatar uma espécie de meta-aura, qual facho derradeiro, precisamente ao encarnar simbolicamente ao limite a materialidade do processo reprodutor pelo qual a sua encarnação estética é dada à existência e que precisamente lhe nega o tipo de sagração ritual aurática, da obra única, de que Benjamin faz as exéquias; ao mesmo tempo que ilumina, pelo próprio irónico triunfo estético da auto-elegia da tese que condensa, como novas formas de unção das obras por nova aura, como seja pela acessibilidade condicionada (condição de possibilidade do fetichismo) do exemplar raro, se consagram hoje, via que este mesmo canto do cisne abre até à sua foz fenomenológica. Assim se constitui tão manifestamente ponto de charneira este vero manifesto de uma condição expressiva (de arte comodificada), a qual sublinha paroxisticamente ao singularizar-se nela incorporando-a como sua matéria-sujeito, que necessariamente a perfeita consubtancialidade que alcança na confluência trinitária de um meio expressivo, de um discurso sobre esse meio expressivo, e da sua formalização estética num só objecto, foi tomada e finalizada, irrepetível, momento que tem uma ressonância como que absolutizante para a diacronia da expressão estética humana (momentos que podemos retrospectivamente, genealogisticamente, tentar recuperar, o que é constitutivo do raisonnement crítico canónico, mas de que não é, et pour cause, tão evidente apercebermo-nos no seu momento de surgimento, o que provavelmente leva a que mais facilmente se manifeste contemporaneamente em empresa estética servil, de recursos limitados concentrados num formato que demande um gesto estético, ironicamente, mais depurado, imediato, e que, também ironicamente, mais facilmente se perca por essa imediatez na temporalidade resguardada pelos exegetas aturados dos greater schemes of expression), como algo que tão claramente encerre um item do catálogo das coisas que o ser humano pode exprimir (o que não quer dizer que o catálogo não seja sistematicamente reformulado ou ampliado com a transformação das mundividências e vivências humanas). Claro que amanhã poderão esclarecer que já tinha sido feito, e poderão vir a fazer sem saber que já havia sido feito. Mas acho que na tristemente evidente mirradíssima diacronia estética que carrego na cabeça, que para o efeito retórico não deixa de replicar a função das institucionais, nunca tinha percebido tão translucidamente como a marca d'água da perfeição é literalmente o esgotamento. Estava pasmado e algo assustado, para ser franco, até me aperceber que a marca d'água do discurso reificante esticado aos limites é perder todo o contacto com a expressividade própria (e indissociável) da coisa material, e portanto, umas linhas após, a minha posição talvez tenha passado dos ditirambos que vos, suponhamos, passaram pelos olhos, para uma mais modesta "yá, é gira", ou um pouco mais entusiasta mas ainda arrepelando o blasé "humm, clever" (e talvez devesse ter começado por aqui). De qualquer forma, como expus nesta minha ilustríssima galeria a coisa material e o pecado fica atenuado, acrescente-se quanto não deixa de ser ainda um indicador de monta da monta do objecto o quanto embandeirei em arco à conta da bodegueira de um invólucro de matéria tipográfica prensada, coisa que, sintomaticamente, já me havia retraído de comprar uma edição de uma obra, mas nunca incentivado a fazê-lo, para mais por si só, como obra de arte pois (reproduzida mecanicamente pois), sendo já proprietário do seu conteúdo, drapejado noutra toilette. Enfim, o seu a seu dono: David Pearson, o único nome de designer que espero vir a registar)