Currículo
Sem ter empregue truques de qualquer espécie, já por duas vezes, na rua, foram as Testemunhas de Jeová que acabaram por fugir de mim.
(I'd do it all over again but I'd rather not)
Sem ter empregue truques de qualquer espécie, já por duas vezes, na rua, foram as Testemunhas de Jeová que acabaram por fugir de mim.
Etiquetas: barbaridades avulsas
A Visão da última quinta-feira tinha um suplemento especial com o título «O dia que abalou o mundo», dedicado ao terramoto de Lisboa de 1755. Hoje, o Público expõe o título «Os 9 minutos que abalaram o mundo». O PRIMEIRO destaque em ambos, é que o terramoto abalou o MUNDO.
Admito, em penitência, que posso ser eu que já estou demasiado inoculado e encaniçado contra as patéticas materializações do orgulho nacional que se inventam neste país (como a persistência em conjecturar os recordes do Guiness mais acéfalos possíveis – se fosse da Guiness...). Mas parece-me que chegámos ao ponto de, ainda que inocente ou inconscientemente, o pendor para a projecção nacional já nem ter pejo de se sustentar em chão de cadáveres e destruição (que orgulho!, o Voltaire escreveu sobre o assunto! E o monstro de Loch Ness ficou com uma enxaqueca com a agitação no lago! E foi um grande dia de surf nas Caraíbas!). É verdade, não li os suplementos em detalhe, mas entre competentes e sensatos dossiers históricos, políticos, geológicos e arquitectónicos (e neste plano já se dizem abertamente loas ao terramoto por ter permitido o “arranjo” pombalino – ahhh, a distância histórica), cheira-me que lá pelo meio não deve faltar uma subtil referência a «o meu tsunami foi maior que o teu».
Etiquetas: à boleia
Não acredito muito em reciprocidade. Ao contrário do velho Mauss, acho que estraga a dádiva. Por isso, esclareça-se que este post (fora este preâmbulo e parte do posfácio), inspirado no post que me fez ancorar na Terra Habitada, estava pensado antes de o seu Senhor me ter retribuído generosamente a grata adjectivação de túmido (claro que mesmo que não estivesse pensado o post a priori, não era reciprocidade fazê-lo agora, porque só meia dúzia de túmidos – não é força de expressão - aqui espreitam, e reciprocidade por reciprocidade, porra, ao menos que não fosse falsa porque inconsequente).
(fecha preâmbulo eeeeee Cena!):
Olhem que é obra, mandarem-nos à merda e fazerem-nos gostar:
«O Agrafo sabe que as suas aparições são sempre motivo de algum pânico. Justificado: o Agrafo só costuma dignar-se a conviver com as multidões quando assume como sua a missão de lhes apontar impiedosamente a inefável estultícia que sempre as caracteriza. Mas o Agrafo, na solidão lendária a que se remeteu por horror aos néscios, não ocupa o seu tempo exclusivamente com a anotação meticulosa da merda que permanentemente fazeis para um dia mais tarde vo-la esfregar no focinho. Não. O Agrafo também se dedica, entre outros porventura inconfessáveis, aos prazeres tão humanos da navegação electrónica. E hoje, excepcionalmente, o Agrafo deseja partilhar convosco algumas coisas belas e/ou engraçadas e/ou giras que foi descobrindo nos últimos tempos e que, julga o Agrafo sem grande convicção, talvez possam fazer algo pelo preenchimento dos vossos espíritos inanes. »
Posfácio: sim, é verdade, no meu caso é até bastante fácil mandarem-me à merda e fazerem-me gostar (os meliantes que me bifaram 3 euros de trocos na passada quarta-feira sob ameaça de cotonetes sem o algodão conseguiram com a maior das facilidades que eu lhes retorquisse com um sincero agradecimento à imprecação «só tens isto?! Vai à merda!»). Mas creio que leitores mais insuspeitos retirarão a mesma conclusão que eu da leitura daquele fragmento. Se não, tomam-se demasiado a sério, patologia de consequências gravosas para a humanidade.
Segundo posfácio(?!): há dádivas para as quais não há reciprocidade. Nunca poderia pagar a subtil sugestão do Senhor da Terra Habitada: segunda-feira vou já fazer uma visita ao meu alfaite. O meu monitor nunca mais me reflectirá da mesma maneira...
Etiquetas: interblogging... such a sad ménage
Quando a realeza começa a trepar mais que nós (enfim, eu generalizado, a plebe), os limites da mobilidade social ficam duplamente demarcados.
(«has the world changed, or have I changed?»)
Etiquetas: barbaridades avulsas
À procura da capa do disco dos Brass Monkey, a primeira coisa que o Google alegremente escancarou à minha frente foi isto:
Ou o Google está querer dizer qualquer coisa sobre mim (e pela minha parte preferia ver o tio Martin de tanga do que este marmanjo a exibir as suas big balls - sim, é mesmo o título da fotografia, quem disse que a publicidade a roupa interior não é subtil? basta ver o nada conspícuo ícone do macaco)...
ou então acho que alguém devia avisar o tio Martin que o Google o anda a misturar na gaveta das tangas de leopardo (a menos que o maroto já estivesse avisado, afinal, é bem sabido que na velha Albion «it's cold enough to freeze the balls off a brass monkey», e a malta gosta de o dizer, só que certamente não com ceroulas destas; o homem tem a sua dignidade)...
Pela minha parte, pela sua selectividade, acho que só me cabe dizer ao Google: «Brass Monkey my ass».
Etiquetas: grafonola e ecos
Que se dane, vai durar pouco, mas, por um minuto que seja, que se solte a fanfarra!...
Brass Monkey com eles!!
Etiquetas: grafonola e ecos
Esqueci-me de dizer ao médico que já estou no estado de ver o mesmo episódio do MASH 3 dias seguidos.
Acho que era um importante elemento de diagnóstico.
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Em casa, adoentado, há dias a fio, a única coisa capaz de me despertar um assomo de righteous indignation é estarem há duas semanas a repetir os mesmos episódios do MASH.
Etiquetas: à bolina
Sempre achei que o uso socialmente sancionado de substâncias com efeitos desinibidores funciona muito mais como porta social de legitimação para comportamentos excepcionais face a padrões socialmente esperados de interacção em certos contextos, do que como potenciador meramente químico desses comportamentos. A borracheira (ler o “ch” à espanhola, como bom raiano), pareceu-me pois sempre socialmente formatada, não só na construção óbvia das circunstâncias em que tal processo adquire sentido, mas na sua própria conformação etílica, ou seja, na configuração dos gestos e das palavras de quem no éter se instala.
Isto porque a generalidade das bebedeiras (lúdicas, atenção) a que assisti na minha vida me surgiam sempre com uma dimensão performática relativamente evidente, conquanto certamente lubrificada, em que o indivíduo não deixava de, na sua alteração química, se posicionar estrategicamente face à prévia classificação da sua conduta como bêbedo. Confissões, exposições corporais, gestualidades exercidas sob capa da facécia alcoolizada (homoerotismo, anyone?), paixões finalmente em movimento porque por tal capa seus gestos eram sancionados (e o que se faz da paixão passado o prazo de impunidade é outra matéria), tudo isto sempre presenciei com o sobrolho mental levantado, ainda que com a disponibilidade humana aberta, afinal, o carecer de tal desculpabilização para libertar certos revolvimentos íntimos não merecia menos o beneplácito de humano reconhecimento. Mas a natureza de tal procedimento tanto mais se tornava evidente, quanto eu próprio nunca me vira, por mais entornado que estivesse, em disposição corpórea ou psicológica de descontrolo e desinibição que me levasse a exercer equivalentes daqueles comportamentos excepcionais (é certo que o facto de ser desviante na minha condição não etílica pode infirmar esta tese toda, mas tal ainda está a precisar de evidência empírica sistemática).
Tal não implica advogar o retirar o estatuto de borrachón a quem se apresente, mesmo que suspeitosamente, sob tal categoria, pois ameaçaria sancionar abusos de estados físicos e psicológicos que, mesmo não estando plenamente diminuídos, obviamente e em circunstância alguma legitimam formas de acção que se espoletam pela presunção dessa diminuição. Nem sequer se pretende propriamente contribuir para restringir o soltar a franga que essa condição socialmente legitimada permite (considerando apenas os casos não-profissionais de alcoolismo, obviamente - aí as categorias são outras). Isto serve apenas uma atenção pessoal ao olhar não censório desses gestos libertos: nunca me fiei em pensar que as falas recônditas que se desvelavam nesse momentos instituídos de excepção social fossem inocentes como as (supostamente) das crianças. O seu peso aparecia-me sempre como requerendo cuidadosa ponderação.
Não será pois pelo hálito que diminuirei a ressonância dos actos e das palavras. Pelo hálito só velarei da reciprocidade das minhas respostas.
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Voz amiga comentava o achar escassa a minha produção bloguística, considerando a longa reflexão silenciosa que dizia caracterizar o prévio que ela conhecia da minha vida.
Deixemos de lado o facto de o começar a blogar parecer exercer o efeito de socialmente se presumir que deixámos de ter outras coisas para fazer. Em certo sentido, até é expectativa lisonjeira, ainda que exigente.
O que nunca cessa de me espantar é que, na superfície visível do mutismo, seja tão recorrentemente confundida por postura reflexiva a disposição corpóreo-verbal do torpor.
Caso houvesse dúvida, esclareça-se mais uma vez que o meu caso é mesmo o segundo.
A explicação seria por demasiado longa, talvez uma vida inteira. Por pouco que tal compreenda, seria já demasiado para a sua serventia, no acumular da incompletude, no tolher do seu fazer.
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Não poder comer, não poder dançar, não poder beber, não poder cantar, não poder foder, não poder amar...
Despojado de verbos, não se pode ser.
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Há seres, para lá de nossos pais, relativamente a quem, com certo tipo de propriedade, podemos dizer que devemos a vida. Não que lhes dediquemos mais do sentimento que se não pronuncia, do que a outros. Simplesmente, em dado passo situado da nossa vida se fizeram chão do passo seguinte.
Neste momento, surgem-me estes na mente (outros, que metafisicamente se não estivessem borrifando ou ofendendo com tão indigno evocador, não levem a mal, que os passos de uma vida não se resumem num post).
Sabemos que para tais dívidas, não há simbolismo, nem facécia de Dalí, que esconjure a dávida sem escolha ou pedido que nos segurou o passado e possibilita o presente.
Suponho que a única retribuição é deixar ecoar nos mistérios da consciência a imaginação de uma interpelação inconfessada à nossa estrita individualidade, apenas etereamente consignada às subjectividades que passem, a busquem, a acolham: «please keep me in mind» (ora vejam quem também resolveu aparecer…) .
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Ouvi já a história de diversas formas, de diversas fontes. No seu mais básico reza qualquer coisa como isto: Dalí faz chegar a seu pai uma amostra do seu esperma com a seguinte mensagem - «agora estamos pagos».
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Sei que é recorrente e injusta generalização tomar "os políticos" (a expressão é todo um programa) como massa informe de volúvel constituição humana, máscaras ressequidas da prossecução constante de fins que se equilibram no seu reflexo entre a auto-promoção e certo ideário político fixado na estreiteza táctica partidária. Mas, creio que principalmente nas Jotinhas, e talvez mais naquelas atreitas a vontades de poder ou a um evangélico conservadorismo, sinais exteriores de uma condição interna misteriosa despontam de forma preocupante.
Vi no meu crescer etário algumas pessoas serem em fresca idade atraídas para as socializações de juventudes partidárias (principalmente aquelas atrás apontadas, donde o meu viés – se bem que tendo conhecido uns poucos esquerdistas juvenis me incomodasse menos, ainda que não pouco, a sua cassete que a plasticina dos outros), sendo que os nossos diferentes caminhos deixaram rasto parco de reencontros. Quando estes sucedem, é gritante, a cada avistamento e troca de palavras, a sedimentação dos gestos de plástico, das frases tiradas de um cartão de instruções. Eu não sei o que se passa naquelas catacumbas de doutrinação juvenil (as Jotas aliás deviam ser proibidas por excesso psicológico de doutrinação, operação perniciosa às criancinhas impressionáveis). Os humanos Jotas que me perdoem, e me tomem por alerta, mas o que eu queria saber, para exorcizar popular e eventual injusta generalização, é se alguém já tocou alguma desta gente por dentro da pele, e se lá por baixo não havia uns revolventes tentáculos a mecanizar sua acção e pensamento.
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E ao sétimo dia o pseudo-deus-parcial do blogue descansou (até porque já era o oitavo e o miserável nem tinha poder para se fazer pagar horas ordinárias, quanto mais extraordinárias), viu a sua obra, e pensou que merda dali sair(í)a.
A observação é das menos originais possíveis, mas precisamente a recorrência do fenómeno que lhe dá origem requer também a recorrência da sua sinalização: invariavelmente, estando em bar ou café com uma presença feminina, o empregado não hesita um segundo em depositar o meu descafeínado nas mãos da minha companhia.
Se o denuncio, claro, é porque o reconfirmar da minha socialmente construída e simbolizada masculinidade («este gajo não tem pinta de um mariquinhas que bebe descafeínados!») só dura o segundo que entremeia com o esclarecimento de que o descafeínado é para mim.
É uma chatice, mas é inevitável, termos que fazer pedagogia às nossas custas (diz o macho, uof).
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João César das Neves, numa das suas melhores prosas (honestamente – consegue debitar descrições do panorama televisivo que, no meio da terminologia beata caquética, até soam justas, para depois retirar as suas conclusões enviesadas) dizia esta segunda-feira (bolds e comentários a verde meus, pois claro):
«(...)
Devo confessar que não falo por experiência directa. Há anos classifiquei esses programas na categoria de "lixo tóxico" e deixei de ver.
(...)
Adultério, aldrabice, fornicação (sic), corrupção e malandragem (sic) são a dieta quotidiana da televisão.
(...)
Não é Portugal (país de extracção pura e devota, sem meretrizes, efeminados ou pederastas), mas o pequeno mundo da televisão, que faz germinar porcarias destas (sic).
(...)
Por exemplo, dizem-me que nestes meses vários concursos e novelas decidiram outorgar ao país um curso catequético (ele sabe do que fala) completo sobre homossexualidade. Impondo os dogmas do género (sic) e elaborando as doutrinas da seita (sic), querem apresentar essa visão como a única verdade aceitável (não me tinha constado que nas operações desses programas se incluía um extreme make-over anal aos candidatos...). O pedantismo é o mesmo dos antigos programas do Movimento Nacional Feminino (sic) sobre lavores ou economia doméstica (sim, aquelas gajas salazarentas julgavam-se as Rainhas Vitórias do pedaço); a subtileza é igual à das Conversas em Família, de Marcelo Caetano. Só que sobre sodomia» (confesso que gostei da retórica desta última elaboração... Só ficamos à espera que o nível da comparação suba de bichas e Estado Novo para a homossexualidade como nazismo cultural).
Para quem não fala por experiência directa... deve ser conhecimento iluminado.
Antes que redundantemente o eventual leitor o pense e mo aponte mentalmente, confirmo a minha natureza hipócrita e que da consciência de tal sou portador.
Isto para dizer que, por diversas razões, nunca tive grande disponibilidade para me imergir na vivência da blogosfera (verdade seja dita, socialização, ou não exageremos tanto, oblige, essa disponibilidade já foi menor). Dei muito tempo por mim a visitar com regularidade e desabrido gosto apenas um blogue, ou melhor dito, autor, a que muito lentamente fui agregando mais um e mais outros.
(Bem entendido, não há aqui margem para ofensas, já que nunca pesquisei activamente blogues para ler, e sou a última pessoa a poder arrogar-se ser o guia Michelin dos blogues portugueses ou de qualquer outra circunscrição)
Ora, dá-se o caso curioso de aquele triunvirato iniciático ser composto por assumidos (pelo que não faço inconfidência), conquanto não prosélitos na postura ou encerrados na temática, cristãos. É certo que não sou pólo de validação de uma amostra decente, e tais juízos são subjectivos, mas será tal atracção um acaso?
Dantes tínhamos explicações sociais bastante auto-suficientes, em que das educações de seminário de muita rapaziada, mesmo sem vocação, que não tinha outros meios de aceder ao universo letrado, saíam traumatizadas mas intelectualmente bastante competentes criaturas. Não parece ser esse o caso aqui, em novas gerações (mesmo em certas socializações protestantes). Pelo que inquirição se requer sobre o assunto.
Nunca pensei repensar as filiações religiosas a uma luz instrumental (que é das coisas que delas me afasta: se fosse um deus chamuscava – não fulminava... era um deus banana - todos os jogadores que se benzem para marcar um golo), mas se daí ainda extraísse o benefício (preferencialmente transcendental, para dar menos trabalho) de uma renovada devoção, competência ou interesse intelectual, começaria a reconsiderar renovar a assinatura.
Não há melhor símbolo de um certo estado de civilização que desenvolvemos do que rosas inodoras.
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Felgueiras e quejandos já foram dissecados. Nem tudo se perdeu. Ainda que possam partilhar de subterrânea corrente, bem sinalizada por Elísio Estanque no Público (sem link, ora pois), falemos do que não é novo, do que mais recorrente seus efeitos daninhos tem disseminado.
É velha a discussão sobre até que ponto a democracia pode incorporar no seu funcionamento institucional e na regulação do espaço público as sementes explícitas da sua negação, como o caso de recentes manifestações de extrema-direita (ao contrário de outros, não nos tranquiliza o facto de tais manifestações incorporarem pacóvios que nem nomear os seus objectos de ódio eram capazes).
Mas não é preciso entrar em profundezas filosóficas para perceber que o que Alberto João Jardim opera no controlo das instituições políticas da Madeira, com todas as suas profundíssimas ramificações de controlo de virtualmente todas as formas de organização da vida social e possibilidades de integração e expressão dos indivíduos na mesma, se tem vindo a aprofundar na negação formal e processual da matriz democrática. Já não bastava o controlo obsceno do espaço público madeirense na sua vertente mediática, o alimentar de redes de dependência social e económica cada vez mais disseminada de virtualmente todo o tecido social madeirense face aos poderes e influências do governo regional, como cada vez mais directa, descarada e displicentemente se efectua a pressão de constrangimento político-financeiro sobre as autarquias (orgãos descentralizados) que se eximam ao seu domínio monocromático.
A sua impunidade é dos mais graves sinais que um regime político democrático pode transmitir na sua pedagogia de cidadania - ah pois, é que a acção política não é inconsequente: depois não se queixem da qualidade dos cidadãos. Não há verdadeira democracia sem condições de democracia, o que também não quer dizer, para os não radicais da transformação social sem garantias, que se prefira viver sem o seu simulacro. A partir dele sempre se pode construir algo. Mas francamente cada vez mais esta impunidade política começa a esborratar a linha que divide o processo democrático da mimese democrática, e esse, esconjurado no nosso contente imobilismo, pode ser na verdade ser um ponto de não retorno.
O facto de os atentados políticos do homem estarem há muito arrumados no caixote do anedotário nacional (o que diz muito sobre a qualidade e o viés populista do nosso poder mediático também) apenas camufla a ausência de regulação do regime democrático. Porventura andámos a ver demasiado as supervisões de eleições pela ONU em países sobre os quais julgamos poder olhar sobranceiros. É que parece que não nos damos conta que há outras formas de invalidar o processo democrático para além de dar um arranjinho aos votos na urna. São mais insidiosas, mais complexas, e exigem elas também o cumprimento dos trâmites de um Estado de Direito, pois que sem dúvida também é uma linha ténue que separa o resguardar da democracia da sua própria negação. Mas contemos pelos dedinhos o tempo que já lá vai. Acho que já era tempo de ponderar se a ONU não se quer também ocupar do nosso caso.
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Estruturalmente, há poucas opiniões (já – em aparente contradição - a episteme de Foucault o dizia, com um pouco mais de palavras). Há menos opiniões interessantes. Há ainda menos opiniões válidas (e mais opiniões interessantes sobre o que é válido ou não). E demasiada gente a opinar sobre o que não interessa (excepto quando opinam a validade de opinarem o que não é válido nem interessa) – oui, c’est moi.
Os blogues tiveram o efeito social de dar espaço para cada vez mais indivíduos levarem essa sua condição moderna mais longe e tomar a sua opinião como algo válido para ser expresso publicamente por novas vias, mais distendidas. O que chateia mais gente que a democracia, mas menos gente que os sabichões de café.
Considerando que o mais certo era que se todos parássemos um minuto para pensar sobre o que se diz verificaríamos a redundância atroz de tantas palavras, tal seria um cataclismo psicológico de massas: socialmente inaceitável... Até porque a redundância não é grave. Na verdade as palavras precisam de diversos circuitos para circular por diversas gentes. Mas se olhássemos para essa redundância, talvez demonstrasse que neste ruído todo, (olha a novidade) nos interessam menos as opiniões que opinar. Tal não é evacuar de sentido as proposições que nos guiam o discurso e a acção (sendo que podem ser mutuamente contraditórias). Mas reconhecer que a sua expressão não pericialmente encaixotada (como pretende, em parte, ser o espaço de gestão esconsa da pessoalidade da blogosfera) é uma operação egocentrada. Pois se é de ego que se trata, assumamo-lo, porque não é tão drástico para o nosso posicionamento no real como parece. Os relativismos, incluíndo os egotistas, são enganadores no seu presumido autismo. Não nos percamos mutuamente em subterfúgios. Falemos do ego. Despudoradamente. Pois que a realidade virá certamente agarrada, é matéria pegajosa que se oferece a matizes diversos, e os matizes que lhe confiramos são a virtude desses egos, a sua relativa salvação social.
Bem vistas as coisas, desde quando é que a realidade nos serviu para outra coisa senão para nos situarmos nela?
Numa véspera de fim de ano foi subitamente ressentida, honestamente, pela primeira vez, a antecipação da morte, inaugurando padecimentos duradouros dos quais toda a celebração, por eles não interrupta, foi iniciática.
Alguns amigos na altura presentes recordaram-no como um bom momento de humor.
Das exíguas almas a que outorgo ideia de amizade, boa parte (and counting) se tem postado à distância da voz e do olhar (do tipo vintage humanamente destilado). Se algum mérito a tecnologia pode ter, é dar um sentido mais nobre às insuficiências humanas. Keep in touch é frivolidade que não subscrevo. Se me devo alcandorar a miradouro contingente, para emprenhar de surpresa interacções de outras formas despojadas, pois seja, este é o posto (e seu prazo de caducidade) donde entabularei certas conversas inacabadas (na permanência de buscar as suas formas e intimidades). Daquelas que se sussurram na penumbra e negam o atentado atroz da madrugada às noites que se prolongam suavemente desveladas. Os seres conhecem-se e perdem-se para se reconhecer novamente, sempre em zonas de sombra. Façamos-lhes justiça. E seja benvindo quem vier por bem...