...(a negação que se segue) - Não há coincidências: a ilha monocromática
Felgueiras e quejandos já foram dissecados. Nem tudo se perdeu. Ainda que possam partilhar de subterrânea corrente, bem sinalizada por Elísio Estanque no Público (sem link, ora pois), falemos do que não é novo, do que mais recorrente seus efeitos daninhos tem disseminado.
É velha a discussão sobre até que ponto a democracia pode incorporar no seu funcionamento institucional e na regulação do espaço público as sementes explícitas da sua negação, como o caso de recentes manifestações de extrema-direita (ao contrário de outros, não nos tranquiliza o facto de tais manifestações incorporarem pacóvios que nem nomear os seus objectos de ódio eram capazes).
Mas não é preciso entrar em profundezas filosóficas para perceber que o que Alberto João Jardim opera no controlo das instituições políticas da Madeira, com todas as suas profundíssimas ramificações de controlo de virtualmente todas as formas de organização da vida social e possibilidades de integração e expressão dos indivíduos na mesma, se tem vindo a aprofundar na negação formal e processual da matriz democrática. Já não bastava o controlo obsceno do espaço público madeirense na sua vertente mediática, o alimentar de redes de dependência social e económica cada vez mais disseminada de virtualmente todo o tecido social madeirense face aos poderes e influências do governo regional, como cada vez mais directa, descarada e displicentemente se efectua a pressão de constrangimento político-financeiro sobre as autarquias (orgãos descentralizados) que se eximam ao seu domínio monocromático.
A sua impunidade é dos mais graves sinais que um regime político democrático pode transmitir na sua pedagogia de cidadania - ah pois, é que a acção política não é inconsequente: depois não se queixem da qualidade dos cidadãos. Não há verdadeira democracia sem condições de democracia, o que também não quer dizer, para os não radicais da transformação social sem garantias, que se prefira viver sem o seu simulacro. A partir dele sempre se pode construir algo. Mas francamente cada vez mais esta impunidade política começa a esborratar a linha que divide o processo democrático da mimese democrática, e esse, esconjurado no nosso contente imobilismo, pode ser na verdade ser um ponto de não retorno.
O facto de os atentados políticos do homem estarem há muito arrumados no caixote do anedotário nacional (o que diz muito sobre a qualidade e o viés populista do nosso poder mediático também) apenas camufla a ausência de regulação do regime democrático. Porventura andámos a ver demasiado as supervisões de eleições pela ONU em países sobre os quais julgamos poder olhar sobranceiros. É que parece que não nos damos conta que há outras formas de invalidar o processo democrático para além de dar um arranjinho aos votos na urna. São mais insidiosas, mais complexas, e exigem elas também o cumprimento dos trâmites de um Estado de Direito, pois que sem dúvida também é uma linha ténue que separa o resguardar da democracia da sua própria negação. Mas contemos pelos dedinhos o tempo que já lá vai. Acho que já era tempo de ponderar se a ONU não se quer também ocupar do nosso caso.
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